Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Esse ano, fui convidada pelo professor Leonardo Guelman, diretor do Centro de Artes da UFF, para realizar a curadoria do UFF Debate Brasil, projeto que acontece há mais de 30 anos no Teatro da UFF visando promover o debate de temáticas relevantes para a sociedade, a partir da universidade e seus aportes teóricos e reflexivos. Aceitei com prazer o desafio, principalmente por ser fã do projeto, ao qual compareci muitas vezes como plateia e como debatedora.


Nessa função, realizamos cinco debates inesquecíveis e planejamos outros dois que não chegaram a acontecer em função da greve dos três setores (professores, técnicos e alunos) na universidade em 2015, mas que com certeza também teriam sido lacradores. Agora, em razão de demandas outras que assoberbam a nossa vida enquanto docentes de universidade pública, me despeço da curadoria, e gostaria de expressar aqui meus agradecimentos a todos que me ajudaram nesse processo, fazer alguns comentários sobre os debates realizados e mais uma vez agradecer muito ao Guelman pelo convite, pela confiança e pela possibilidade aberta para desenvolvermos essa etapa do UFF Debate.

Assim, queria agradecer imensamente, em primeiro lugar, à Ohana Boy Oliveira, minha assistente de curadoria e mediadora em inúmeros debates, poucas parcerias na minha vida profissional são tão perfeitas quanto a que tenho com essa diva! :) Agradeço também à equipe de produção do UFF Debate Brasil, Tânia Perez, Ana Cristina Oliveira e Daisy Pinto, que há anos vem conduzindo o projeto e nos receberam cordialmente nessa parceria, e que agora seguem na coordenação do mesmo, como na produção do próximo UFF Debate Brasil de 8 de dezembro de 2015, com o tema "Faces do terror - entendendo a história". Estendo o agradecimento à toda a equipe do Centro de Artes e do
Teatro da UFF, que nos acolheram e ajudaram no que foi preciso para o pleno funcionamento dos eventos.

Queria também dizer muito obrigada a meus alunos e ex-alunos amigos, que voluntariamente me ajudaram na cobertura midiática dos debates, fazendo as postagens, fotografias, filmagens e edições: Lia Ribeiro, Clara Sacco, Ioná Ricobello, Luiza Gomes, Raphael Azevedo Silva, Rodrigo Freitas e Bruno Pacheco. O espírito colaborativo e republicano de vocês é comovente. E vão ganhar um churrasco de gratidão, aguardem!


Seguindo com os agradecimentos, meus mais sinceros a todos os convidados que toparam nossas propostas e realizaram debates inesquecíveis, de altíssima qualidade, que com certeza marcaram todos os presentes. Alguns momentos dos mesmos foram tão impactantes e emocionantes que até hoje reverberam em mim e em várias pessoas com quem falo sobre o que presenciamos (para quem quiser saber mais sobre os debates, sugiro seguir a página do Facebook do UFF Debate Brasil). Meu muito, muito obrigada a todos que listo abaixo, o mundo precisa de vocês!:

1) Debate de maio, "Infância para quem? Desigualidade social e penalização da vida", com Orlando Zaccone, Juliana Farias e Mônica Cunha, e mediação de Adriana Vianna.


2) Debate de agosto, "Novas tecnologias, velhas práticas? O poder do jornalismo sobre a opinião pública", com Paula Máiran, Octavio Guedes e Raull Santiago, e mediação de Ohana Boy.


3) Debate de setembro, "A vez e a voz dos coletivos urbanos: disputas pela cidade", com Dudu de Morro Agudo, Dani Francisco e Carlos Meijueiro, e mediação de Leonardo Guelman.


4) Debate de outubro, "AFROntando o racismo: Kbela e o protagonismo das mulheres negras em cena", com Janaína Damaceno, Silvana Bahia e Daiane Ramos, e mediação de Ohana Boy.


5) Debate de novembro, "A fantástica fábrica do preconceito: mídia, representação social e senso comum", com Marcelo Freixo, Kleber Mendonça e Dani Araújo, e mediação de Ohana Boy.


Queria aproveitar aqui também para agradecer aos convidados que aceitaram participar dos outros debates que planejamos para junho e julho, mas que não puderam ser realizados em função da greve (da mesma forma, o professor Márcio Castilho, do curso de Jornalismo da UFF, foi convidado a participar do UFF Debate sobre a questão do jornalismo, mas não pode aceitar em razão da greve):

- debate planejado para junho - tema "Vozes abertas da América Latina": processos de democratização política e midiática", convidados Dênis de Moraes, Gustavo Gindre e Paula Máiran, com mediação de Lívia Reis
- debate de julho - tema "Na Babilônia moderna: mídia e representatividade", convidados Jean Wyllys e Pedro Bial, com mediação de Marildo Nercolini.

Por fim, mas mais importante, queria agradecer ao público que compareceu aos debates, participou, ouviu, falou, perguntou, riu, chorou, se emocionou, xavecou, interagiu, aprendeu, ensinou, lotou aquele teatro. Foi maravilhoso participar dessa onda de afeto e conhecimento!






É isso. Foi uma experiência bacana e enriquecedora. Como disse acima, vivi momentos inesquecíveis nas edições que fizemos. E fico feliz por ter contribuído nesse momento com esse projeto tão importante para a universidade, que busca complexificar as discussões e colocar em pauta temas e objetos que impactam em nossa vida cotidianamente. Acredito que esta é a principal função da universidade pública e me alegro por ter participado desse processo. Sigamos complexificando, ampliando o diálogo, abrindo espaços para outras vozes e sujeitos sociais, visando democratizar a universidade para além de seus muros e títulos.


Vida longa ao UFF Debate Brasil! E muito sucesso aos que estão conduzindo o bastão agora. :)
Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Quando Hermann Hesse, escritor alemão, foi contemplado com o Prêmio Nobel de Literatura, ele escreveu ao seu amigo de longa data Thomas Mann dizendo: "E muitos velhos leitores meus alegraram-se porque agora fica claro que a fraqueza que tinham por mim não era apenas um pecado" (HESSE, Hermann e MANN, Thomas. Correspondência entre amigos. Rio de Janeiro: Record, 1975:87).

Pensei nisso quando recebemos, essa semana, a maravilhosa notícia de que a tese da minha querida Flora Daemon, já publicada em livro pela Garamond em 2015, Sob o Signo da Infâmia. Das violências em ambientes educacionais às estratégias midiáticas de jovens homicidas/suicidas, que tive o prazer de orientar, foi contemplada com Menção Honrosa no Prêmio Capes de Teses 2015. Flora (comigo a reboque, hehe) recebeu muitos parabéns, o que muito nos honrou. Mas o prêmio, a meu ver, só deixou claro o que eu já havia dito muito antes, desde que terminei de ler o material que ela havia me enviado: trata-se de uma tese excepcional, feito com coragem e talento.

Sobre a tese, digo de novo: é excepcional, é pra todo mundo ler! Quem quiser saber o que penso dela mais detalhadamente, pode ler, na íntegra, o doce e orgulhoso prefácio que tive a honra e o prazer de escrever para o livro: link aqui. Como explico por lá, na tese a autora "escolheu compreender o que leva jovens a optarem por gravar seu nome na história a partir de atos infames, praticando o que Flora Daemon tão bem conceituou como crimes que envolvem “estratégias comunicacionais de inscrição post mortem”. Trata-se, em geral, de ações praticadas em lugares públicos, como escolas, em que esse jovens atiram em várias pessoas, deixando um rastro de mortos e feridos, culminando sua performance com o suicídio. E que têm em comum, além dessas características, o fato de envolverem a produção do que a pesquisadora chamou de “pacotes midiáticos”, que são disponibilizados das mais diversas formas (...)". Como digo ao fim do prefácio (na verdade, um pósfácil, porque o livro fala por si), trata-se de"uma leitura imprescindível para todos, porque precisamos de mais humanidade, mais compromisso, mais complexidade, mais reflexão".

O prêmio, como brincou Hesse a respeito do seu Nobel, confirmou a todos que "a fraqueza que eu tive pela tese não era apenas um pecado". :) Trata-se de trabalho urgente e definitivo sobre o tema, que precisava ser encarado de frente. Flora Daemon deu show! Agora até a CAPES e o mundo sabem. ;) Eu já sabia.

Mas para além da alegria com essa premiação e a possibilidade de fazer o comentário jocoso aí em cima, hehe, as congratulações me fizeram pensar também sobre essa coisa de orientação. Não sou uma orientadora das mais mais. Não é falsa modéstia, não falo isso pra colher louros, sou ariana, preciso disso, não. Por exemplo, sou uma professora de excelência, sei disso, me dizem isso e sei disso. Mas como orientadora tenho lá meus percalços, não escondo de ninguém, não é das atividades acadêmicas que mais amo no mundo. Tenho dificuldade de me concentrar no tema dos outros (Flora Daemon sabe disso como ninguém, hahaha), não respondo prontamente a emails, não tenho paciência com dramas exagerados de orientandx, acho tudo meio chato, enfim, como disse, sou ariana antes de ser orientadora, hehe. Aí fiquei cá comigo se merecia mesmo esses parabéns que recebi a reboque do prêmio justíssimo de Flora, porque foi um trabalho tão autônomo, tão próprio, tão autoral...

Mas depois fiquei pensando que tenho três características como orientadora que talvez estejam aí merecendo uns aplausos mesmo: 1) sempre procuro garantir a autonomia dx orientandx pra que elx, de fato, desenvolva seu potencial no ritmo e do jeito que elx achar melhor. Na medida do possível (porque a mesma CAPES que premia é a que verga o chicote, né?), ou seja, dentro das cobranças e prazos cruéis, procuro entender as temporalidades do povo que cola comigo nessa viagem maluca de orientação, o jeito de escrever, as escolhas teóricas e metodológicas, as afinidades acadêmicas, mesmo as contradições e confusões. Tento, de todo meu coração, reconhecer e respeitar as idiossincrasias e não pressionar ninguém. E procuro lembrar que é só um TCC, só uma dissertação e só uma tese, não é a vida, que é bem maior do que isso e não cabe no Lattes. Em geral, dá certo! ;); 2) não me furto a encher orientandxs de afeto. Acho que afeto move o mundo, nos faz melhor, por isso não economizo. Algumas vezes quebro a cara, mas é da vida. Em geral, isso rende mais do que bons trabalhos, rende maravilhosas amizades para a vida toda; 3) por fim, sempre leio TUDO e ATENTAMENTE. Faço revisão, faço crítica, dou sugestão, elogio. Leio várias vezes. Oriento pra valer. Posso não ser a rainha da paciência nem da concentração em relação ao que o outro está me falando, mas meus orientandxs sabem que podem contar com minha leitura, comentários, dicas.

O resultado disso tem sido muito bom. Não é a coisa que mais amo fazer, tal de orientação, mas no geral os frutos são saborosos e belíssimos. Vide aí o prêmio justísimo da Flora. Quando a gente consegue encontrar nxs orientandxs um pouco disso tudo aí, autonomia, interesse pela pesquisa, espírito crítico, criatividade, investimento, vontade de mudar o mundo, junto com afeto, caráter e amizade, tiramos a sorte grande. Por vezes num rola e os sentimentos são de decepção, ingratidão e desilusão. Doem, mas acontecem pouco e passam rápido. No geral, pela soma de tudo, vale muito a pena. Mesmo pra uma ariana impaciente e desligada. Florite, te amo, esse prêmio é seu, você merece muito, eu já sabia, que bom que agora todo mundo sabe que essa fraqueza de elogiar sua tese num era apenas um pecadinho meu. ;))))
Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Essa fase mágica tá bem poderosa mesmo. Depois do episódio do Hemingway, que narrei no post anterior, agora teve outro momento bem místico mesmo, na viagem pra Salvador/Bahia, nesse Enecult 2015.
Antes deixa eu explicar: amo Salvador, amo muito. Há anos vou pelo menos uma vez por ano pra lá. Me sinto em casa. Respiro bem. Acho linda. Esse ano fiquei meio triste, tá bem gentrificada, enquanto aquela gente não destruir a velha cidade amada não vai sossegar. Mas é sempre um lugar forte, que me marca e me dá sorte. E esse ano não foi diferente!
Começou assim: levei para a viagem meu mp3 velho de guerra. Sempre escuto as músicas na ordem em que coloquei nas pastas, meu ascendente em virgem é metódico e chatinho. Mas nessa viagem, como já tava meio enjoada das sequências, pois não mudo o repertório no mp3, em que cabem 200 músicas no máximo, desde abril, resolvi deixar no shuffle, no aleatório lá do mp3, pra pelo menos ter surpresa. Eis que, aleatoriamente, quando o avião começou a baixar, assim que o comandante avisou: "tripulação, pouso autorizado", começa a tocar aquela música linda dos Doces Bárbaros: "Com amor no coração / preparamos a invasão/ cheios de felicidade / entramos na cidade amada".
Isso na hora de pousar! Me senti muito poderosa! Adorei a coincidência, achei auspicioso. :) E como foi...
Os dias se passaram, tudo muito bom. Falei muito de antigas viagens para lá com os compas que me fizeram cia. Lembrei especialmente de uma amiga amada, que estava afastada de mim há alguns anos, de quem sentia imensa falta, mas com quem não estava conseguindo contato, e já não sabia mais como resolver esse afastamento.
Eis que no aeroporto para a volta, numa aleatória manhã de segunda-feira, estou lá na fila pra despachar a mala quando escuto a voz dessa minha amiga, que não mora em Salvador, era a mais forte e estranha coincidência possível. O arbitrário desse encontro, comigo exclamando: "mas eta que destino! Salve a Bahia! Obrigada, Salvador!", quebrou qualquer encantamento de mal-estar. E foi um reencontro tão lindo e esperado por mim, que jamais esquecerei. Obrigada, Bahia, orixás todos, obrigada cidade amada!
Entrei no avião ainda emocionada, parecia criança premiada. Coloquei o mp3, tomei o remedinho, tava lá no shuffle novamente, tocando as músicas aleatoriamente. E na hora exata em que o avião decolou, exatinha, começou a tocar novamente a música dos quatro baianos porretas, e eu fiquei tão pasma que coloquei no ouvido de Lid pra ter testemunha, porque era muito bom ter chegado e partido ouvindo, sem querer, por absoluta obra do destino, aquela música que homenageia a cidade velha e amada, a que me permitiu o reencontro e a leveza. Viva a Bahia! Viva Salvador! Cidade ainda mais amada.
Mas que essas coincidências estão demais, ah, estão... ;)


Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Já tinha achado engraçado estar no Louvre vendo as pinturas holandesas do século XVII (Rembrandt, van Dick, van Goyen, Vermeer e essa turma toda) no mesmo momento em que estava terminando de ler "O Pintassilgo", de Danna Tartt, que eu havia começado semanas antes de viajar, cuja história se passa exatamente em torno de um quadro de um dos nomes desse período, Fabritius, fazendo com que vários dos nomes e quadros que agora eu via pessoalmente fossem citados e comentados. Mas fiquei emocionada com a coincidência, deu um sabor especial a minha visita ao Louvre e fim de papo, não achei nada a mais, só um acaso legal.
Mas aí veio a história do Hemingway. Antes de contar, queria agradecer à Flora por ter me enviado a linda crônica de Caio Fernando de Abreu em que ele explica como, em Paris, graças a uma coincidência cósmica, ele se conectou definitivamente à grande artista Camille Claudel (quer ler a crônica? Clique aqui). Pois bem, Flora me mandou essa crônica quando eu já estava meio abismada com algumas coisas estranhas em relação a Hemingway e Paris, e ler o texto do Caio acalmou meu coração, porque a vida tem mistérios que nossa vã filosofia jamais explicará, né?
Vamos ao meu mistério pessoal. Cheguei em Paris, cidade em que jamais havia pisado, e me deixei ser conduzida pela minha anfitriã Danic, que gentilmente estava nos hospedando. No primeiro dia ela nos levou em alguns pontos turísticos (catedral, Île Saint Louis etc.), mas o que amei mesmo foi o Jardim de Luxembourg, onde comemos um sanduba e uma tortinha deliciosa. Por mim passava o dia no jardim, ao qual prometi retornar outras vezes. Inclusive existe lá um busto do querido Baudelaire, que apadrinha esse blog, com quem aprendi muito sobre minha arte preferida que é a de flanar (isso também vai merecer outro post).




No segundo dia de viagem, ela nos levou até à rua Mouffetard, parte sul do Quartier Latin, rua muito interessante de comércio árabe, mansardas, passagem estreita e fora do circuito turistão consagrado. Rodamos por lá rapidinho, gostei bastante, e fomos almoçar na Mesquita e passear no Jardin des Plantes, tudo lindo e maravilhoso.







De lá, Dani e uma turma resolveram seguir para outro lugar, e eu e Lid resolvemos retornar para a Mouffetard, queria ver mais a rua, tinha simpatizado muito. Rodamos por lá com calma, paramos num bar pra tomar cerveja (ela) e mojito (eu), passamos por uma pracinha linda, Place de La Contrescarpe, que me deixou encantada, e seguimos por uma rua também estreita, rua Descartes, com uma série de bares e restaurantes dos mais diversos. Quando passei em frente de um deles, de cor predominante verde, simpatizei profundamente e decidi que em outro dia voltaria lá para almoçar. Comentei com Lid e ponto.




Para chegar no jardim de Luxembourg, onde tomaríamos o metrô, caminhamos aleatoriamente por algumas ruas, meio no sexto sentido, eu dizendo "vamos por aqui, agora dobra ali". Passamos por uma igreja muito bonita, Saint-Étienne-du-Mont, passamos por outra igreja menor, onde Woody Allen gravou cenas de "Meia-noite em Paris" e desembocamos na Praça do Pantheon, tudo meio por acaso, sem consultar mapa, seguindo a intuição.


 Quando chegamos no Boulevard Saint-Michel, cerca de 20h, ficamos procurando um café para ficarmos um pouco, mas nada nos agradou muito. Sugeri então pra Lid voltarmos à simpática pracinha, que não era exatamente pertinho, mas ela topou. Resolvi ir por outro caminho, também aleatório, confiando novamente numa intuição, e chegamos mais rapidamente à rua Descartes e a praça de Contrescarpe, onde ficamos até umas 22h nos deliciando. Retornamos andando para o Pantheon e me prometi que até o fim da viagem voltaria àquele lugar, com o qual havia simpatizado profundamente, e almoçaria no simpático restaurante verdinho.
Pois bem, a semana foi passando, Paris se apresentando, fui conhecendo lugares lindos, monumentos inesquecíveis, tudo maravilhoso. Mas seguia considerando aquele trecho Mouffetard/Place de Contraescarpe/Rua Descartes meu preferido até ali. Também ao cabo desta semana terminei enfim "O Pintassilgo" (sobre o qual farei um post caprichado depois) e fui escolher, em meios aos trinta livros que havia salvado no kindle para levar para as férias (exagerada e prevenida, quem nunca?), um para ler. O primeiro em que bati o olho foi "Paris é uma festa", de Ernest Hemingway, e falei: "taí, vai ser legal ler esse aqui, agora".
Num tenho muita intimidade com Hemingway. Li e amei "O sol também se levanta". Não li os outros consagrados. Sei que ele morou e escreveu em Paris nos anos 20 porque vi em filmes e em outros livros que havia lido, mas nada demais. Então, comecei a ler sem muitas expectativas.
Aí já no primeiro capítulo começo a ficar levemente impressionada. Hemingway morou exatamente nos arredores da Place de Contrescarpe, que amava. Tinha um quarto com a esposa na Cardinal Lemoine, bem na divisa com a Praça, e alugava outro só para escrever na rua Descartes. E amava a Mouffetard. Ele conta, numa passagem do livro, que conversando com Sylvia Beach, dona da livraria Shakespeare and Company, que ficava na rue de l'Odéon, não muito longe de onde Hemingway morava, que ela não conhecia aquela parte de Paris, era uma zona mais pobre, boêmia e periférica de Paris (hoje já bem mais turística). Ele conta também que para ir de sua casa ao jardim de Luxembourg, seu outro lugar preferido (outra coincidência) ou para a casa de Gertrude Stein, que ficava na rua de Fleurus, bem próxima ao Jardim, ele optava por um caminho alternativo. E quando ele descreveu o caminho senti medo de novo, porque era o mesmo que eu, aleatoriamente, havia escolhido fazer naquele dia, sem mapa, sem noção alguma de Paris ainda. E que, para voltar do Jardim para a Praça, ele fazia um segundo caminho, menos charmoso mas mais rápido, novamente o que eu havia escolhido fazer.
Isso me impressionou, comentei com Lid e com algumas pessoas, Flora me mandou o texto do Caio, enfim, já tava bonito. Mas teve mais. No dia seguinte à leitura desse capítulo do livro, fomos para Montparnasse. Também adorei, e fui escolhendo lugares aleatórios para pararmos, para tirar fotos, para flanarmos. Pois bem, chego em casa de noite, retomo a leitura e tá lá, o homem e sua família, na sua segunda rodada em Paris, se mudaram para Montparnasse, moraram exatamente no trecho em que rodamos, ia nos restaurantes e cafés que me encantaram. Tava começando a achar estranho mesmo. Mas deixei quieto.


Nos dois últimos dias, eu e Lid resolvemos nos presentear com dias mais livres, voltando aos lugares que mais tínhamos gostado. E no último dia fomos novamente para a Mouffetard e para a Place de Contrescarpe, queria almoçar no restaurante verdinho simpático. Pra evitar muita contaminação com o livro, porque já estava meio impressionada, optei por irmos por um novo caminho, bem mais longo, mas que nos fez conhecer novas e agradáveis ruas. Quando chegamos na rua Descartes, já por volta das 16h, procurei o restaurante verdinho e vi que ele estava fechado, na hora da limpeza. Nos aproximamos pra ver melhor, pra ver que horas abria etc. E quando cheguei perto, vi uma placa na entrada, INDICANDO QUE ALI HAVIA MORADO HEMINGWAY. A minha cara na foto abaixo indica meu pavor.


Juro, fiquei com medo, era coincidência demais. Um pouco por conta disso, em parte pela grosseria do garçom que jogou água na gente para continuar lavando a calçada (hahahahaha, franceses!), optamos por almoçar em outro restaurante, na Place Contrescarpe, que, OBVIAMENTE, era colado ao prédio em que Hemingway morou na rua Cardinal.





Alguém me explica? Tô impressionada até agora. Depois, com calma, vou até ler os outros livros desse homem, porque parece que ele quis falar alguma coisa comigo.
Amei Paris, e amei especialmente os lugares que ele amava. Tamo junto, Hemingway! Jamais esquecerei essa experiência mística.
Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Bem, vamos diversificar, né, meu povo? quer comer um macarrãozinho gostoso e rápido, não precisa ser sempre miojo. Por exemplo, pode ser uma macarronese, ou salada de macarrão. Fiz hoje, tava com saudade, minha mãe fazia mt na nossa casa na infância, adoro! Olha ela aí!



Vamos ao passo a passo:

1) Coloque pra cozinhar o macarrão, daquele jeito básico: coloca a água no fogo, quando ferver coloca o macarrão, coloca umas gotas de óleo pra num agarrar e o sal a gosto (cuidado pra num salgar, olha a pressão, brasil!). Eu usei macarrão parafuso, mas pode ser qq um. Eu deixo cozinhar bem pq gosto dele molinho. Quem preferir al dente, ou seja, mais durinho, uns dez minutos já são suficientes, eu deixo uns 15. E eu escorro pra tirar o excesso de sal e goma. Usei um pacote de 500 gramas.

2) Ingredientes - eu usei um tomate, uma cebola, meio pimentão amarelo, 100 gramas de champignon, 50 gramas de passas brancas, meia cenoura ralada, meia beterraba ralada e uma lata de atum. Deixei tudo picadinho. Eu vou picando no tempo em que o macarrão vai cozinhando, pq odeio ficar muito tempo na cozinha.

3) Misturei tudo e dei uma regadinha no azeite, mas um pouco, só pra dar gosto. Aí coloquei duas colheres de sopa de maionese (eu uso hellmans light). Misturei bem, mas bem mesmo, pra os ingredientes se espalharem e a maionese também.

Depois me deliciei feliz! Molinho, molinho!
E vc pode colocar muitos outros ingredientes, se tiver e/ou quiser: ovo, frango, presunto, muzzarela, ervilha, azeitona, temperos, milho (to evitando porque tá tudo transgênico), alcaparras, batata palha, couve-flor, ah, sei lá, qualquer coisa que vc ache q vai dar um gostinho e alegrar sua macarronese.

Mas uma dica: no máximo 3 colheres mesmo de maionese. Eu uso duas e é suficiente. Pq o truque tá aí. A maionese dá a liga e alegra, mas se colocar muito fica com gosto só dela. Vai por mim, pode parecer q tá seco, mas tá ótimo! Mas se vc preferir bem molhado, aí coloca de três a quatro colheres. Vlw, flw.


Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
No ano passado, uma dor no meu ombro direito foi me deixando doida e praticamente paralisando meus movimentos. Aí fiz uma ressonância e o diagnóstico foi de artrose. Resolvi não me conformar e buscar ajuda. Graças a minha amiga amada Giovana Giovanini, conheci o Rodnei Martins, acupunturista e professor de Qi Gong (ou Chi Kung), uma terapia de exercícios orientais em séries para as diversas partes do corpo.
Minha dor no ombro está controlada, recuperei meus movimentos e ganhei muito mais elasticidade no corpo, a dor da fascite no pé direito está praticamente desaparecendo, não tenho mais dor nas costas, no quadril, pra dar aula estou me sentindo muito melhor, respirando melhor, me sentindo mais tranquila e disposta. Enfim, super recomendo e vou postar alguns links abaixo pra quem tiver interesse em conhecer.
O que venho praticando são as 3 séries das 18 "Terapias Anterior" desenvolvidas no Lian gong. Mas minha meta é cada vez mais expandir meu corpo para outras modalidades do Qi Gong. É um processo a longo prazo e a cada dia percebo maravilhada meu corpo se adaptando a novos movimentos.
O Rodnei, meu acupunturista, é presidente da Associação de Qi Gong do Rio de Janeiro. Eles têm uma página no Facebook, confere lá pra saber mais. :)
Abaixo, um link para uma reportagem do Sá Maria Maria, sobre o Lian Gong, muito bacana!





Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Noutro dia, eu estava dando aula de Cultura Popular e, ao comentar sobre diversidade cultural, fiz um comentário-piada sobre pastelarias e chineses. Na hora quase todo mundo riu, mas alguns alunos ficaram sérios, embora não tenham feito qualquer comentário. Isso me alertou sobre algo dissonante e ficou retumbando na minha cabeça. Pensei sobre isso com calma e na aula seguinte pedi desculpas, aproveitando o acontecido para conversar com a turma sobre o lugar do preconceito no discurso, como "ao falarmos, somos falados", segundo afirma Michel Foucault, e reproduzimos preconceitos e estigmas que nos atravessam no fluxo das ordens discursivas.
Começo meu texto por aqui para dizer que sim, todos nós podemos incorrer em erros e deslizes preconceituosos, pois os imperativos das representações hegemônicas nos perpassam. E todos podemos e devemos pedir desculpas quando nos pegamos nestes processos. Dito isso, gostaria de tecer algumas ponderações sobre o comentário preconceituoso, estereotipante e estigmatizador de William Bonner, editor e âncora do Jornal Nacional, da Globo, na edição de ontem, dia 18 de maio de 2015, sobre um personagem estadunidense (pois se trata de um personagem, uma criação noticiosa, que, por um acaso, tem uma correspondência no "real", que é o próprio sujeito que ali está sendo representado, mas em última instância estamos diante de uma representação, e das mais breves e cerceadoras da diversidade, visto se tratar de uma imagem descontextualizada que é mostrada enquanto a voz do repórter narra a acusação) de uma reportagem sobre uma tentativa de hackear aviões e mexer em seus planos de voo. Bonner comenta, após ver a imagem do suspeito: "O mundo parece que tá ficando muito complicado, né... A gente vê até pelo rosto do sujeito que não tá fácil (...)". A seguir, completa o absurdo: "Cara de maluco ele tem, né? Cá pra nós...".
Minutos depois, na passagem da previsão do tempo, Bonner aproveitou o gancho para se desculpar, dizendo que nas redes sociais foram muitos os comentários desaprovando sua fala. Mas o pedido de desculpas, a meu ver, também precisa ser problematizado: "Teve gente que me censurou porque eu disse que aquele rapaz que entra no avião com um cabo no computador do avião tinha cara de maluco. Na verdade eu fiquei pensando: "que mau humor dessas pessoas"; mas não, elas estão certas. Porque depois eu fiquei fazendo uma reflexão. Eu conheço uma porção de gente com aquele cavanhaque, com o olho meio esbugalhado, mas eles não ficam entrando em avião, não. Não tem nada a ver o rosto do rapaz com o que ele fez ou disse que fez".
Em seu pedido de desculpas tangencial, em que a palavra "Desculpe" jamais aparece, dois pontos merecem destaque: primeiro, a maneira matreira pela qual Bonner reafirma que fez uma brincadeira, tanto que estranhou a falta de humor dos espectadores; depois, a admissão do erro porque não seria justo associar o rosto do rapaz à acusação de ser "maluco" (vou pular aqui os comentários sobre a definição estética do rosto do rapaz feita por Bonner, só isso a meu ver merecia nosso repúdio, mas vamos ao mais grave).
Bem, no meu ponto de vista, aí está parte do problema, do que me incomodou profundamente ontem. Em primeiro lugar, a utilização de um sistema classificatório perverso, instância fundamental de poder (novamente Foucault nos lembra que nas interdições discursivas estão a palavra mentirosa, a palavra proibida e a palavra louca), cuja rotulação causa imenso sofrimento e desconforto a todos por esse sistema classificados como "loucos", independentemente do critério. Ou seja, há uma intensa luta no campo discursivo e político para não se classificar ninguém como "maluco", não só por critérios físicos, mas por qualquer critério. É também sobre isso que fala a importante e sempre urgente Luta Antimanicomial.
Aí vem o segundo problema do infeliz episódio de ontem. Era  dia 18 de maio, Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Caramba, isso era pra ser pauta do Jornal Nacional! Pra isso serve a mídia em concessão pública, pra abarcar as diversas demandas sociais. Não, no jornal total silêncio sobre isso. Ao contrário, seu âncora principal, porta-voz oficial, faz piada sobre "maluco". Isso ultrapassa e muito um simples episódio de piada sem noção, dentro de novo padrão de jornalismo/entretenimento, e se revela um escárnio, uma afronta, um indício revelador do quanto precisamos avançar na luta pela democratização dos meios de comunicação no Brasil.
Mas vamos voltar um pouco mais a Foucault. Ainda sobre as interdições do discurso, ele fala sobre uma estratégia importante das sociedades discursivas para impor seus limites: a autoridade e legitimidade de quem fala. Weber já havia nos alertado para isso, quando abordou as formas de dominação. Lugares simbólicos instituídos são decisivos, em termos de autoridade e legitimidade, para fixar o sentido discursivo, constituir seu caráter performativo, palavra que cria mundo, faz acontecer, vira realidade.
Por isso um professor precisa ter responsabilidade com o que fala em sala para seus 50 alunos. Por isso um apresentador de telejornal de maior audiência do país tem que ter cuidado com o que fala para milhares de receptores. E por isso o pedido de desculpas não pode ser tangencial, tem que ser pra valer, tem que problematizar a questão, tem que sair do reducionismo e da simplificação. Fora isso, é performance pra plateia, é show pra manter audiência, é manutenção do preconceito com outros condicionamentos.
Não, nao é a mesma coisa fazer uma piada sobre "ser maluco" com alguém na mesa do bar ou dizer isso enquanto editor do Jornal Nacional ao vivo. Não, não é a mesma coisa pedir desculpas complexificando a questão ou dando a entender que é uma bobagem com a qual os espectadores resolveram implicar. Sim, a autoridade de quem fala faz acontecer, é discurso fundador, mito original. E sim, a classificação "maluco" (e todas afins) precisa ser banida, por qualquer critério, porque é um rótulo perverso, perigoso, aprisionador e estigmatizante, causa sofrimento e é instrumento de poder e cerceamento da diferença.
E não se importar com isso, porque não te atinge diretamente, é ser cúmplice disso. Lembrando: a roda gira, qualquer hora a boa fortuna também pode te abandonar e o estigma virar pra você. Fica a dica.


Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:

vamos pra receita prometida:

1) em um tabuleiro com forminhas para cupcake, coloque ingrediantes picados. Eu coloquei pimentão vermelho, amarelo, tomate, cebola, cenoura, cebolinha e salsa em alguns. Noutros pedaços de peito de peru e muzarella light. Em outros misturei os dois. Mas pode ser tudo: champignon,milho, ervilha, arroz que sobrou, pedaços de carne, frango, linguiça, atum, ovo de codorna, passas, azeitonas, outras verduras, outras ervas, tudo o que vc quiser ou tiver sobra na geladeira. Sugiro misturar e temperar antes de colocar na forma, pra já pegar um temperinho, um azeite, salzinho, vinagre, o que vc quiser. Mas pouco tempero, pra num ficar molhado, só pra dar gosto.

2) pra um tabuleiro com doze forminhas, usamos 5 ovos. Mas é muito. Use 3 ou 4, vai dar suficientemente. Separe a clara das gemas, pra bater as claras primeiramente. Bata as claras até ficar naquela textura de neve e depois acrescente as gemas e bata junto. Minha mãe usou batedeira, foi mais rápido e rendeu bastante. Lá em casa vai ser no garfo e no bração mesmo, bom que faz exercício ao mesmo tempo.;) Minha mãe colocou uma pitada, tipo uma colher de chá, de pó royal pra dar aquela crescida na massa, mas lá em casa vai ser sem mesmo. E coloquei um pouco de queijo ralado, pra dar liga. E colocamos uma pitada de sal, só pra dar gosto.

3) derrama esses ovos batidos nas forminhas, preenchendo os espaços em torno dos recheios que vc colocou. Eu cobri até em cima, acho q fica legal pq dá aparência de empadinha. :)

4) minha mãe já tinha pre-aquecido o forno por uns cinco minutos antes. Vou fazer o mesmo aq em casa. Coloque no forno, com temperatura alta, por quinze minutos. Se vc achar que precisa tostar um pouco mais, deixe mais uns cinco minutos. Mas fica de olho pra ver se tá estufando direitinho e se tá ficando tostadinha em cima. Cuidado pra num deixar mt tempo e queimar demais embaixo.

Pronto! Acabou! Pode servir e se deliciar. Super leve, rápido, fácil de fazer, e delicioso de comer.:)

As fotos abaixo estão na ordem do que descrevi acima.









Karina Limeira Brandão, mais conhecida como anaenne:
Cena 1 - meados de 2014: mesa de bar em niter, com orientanda discutindo rumo da tese e coisas da vida. Cerveja e coca-cola rolando, mesa do lado de fora prum cigarrinho. Uma hora resolvo ir ao banheiro. Bar já estava fechando, porta de ferro abaixada, portinhola pra atravessar. Vou com um pouco de dificuldade, dou uma leve tropeçada, nada muito dramático, ok. Na volta, quando vou transpor a mesma portinhola, a pessoa rapidamente se levanta, sem falar nada, fica em pé ao lado da porta e me dá a mão pra me ajudar a atravessar. Não faz qualquer comentário, não pergunta se quero ou preciso, só se antecipa e me ajuda. Estava lá, de boa, bebendo, mas se levantou para me auxiliar. Agradeço. Sentemos e seguimos com a conversa.

Cena 2 - segundo semestre de 2014: passo o semestre com problema chato de dor no ombro, causado por uma artrose, que me impede vários movimentos. Por vezes me esqueço pela força do hábito e repito os mesmos, pego peso, sinto dor. No decorrer do semestre todo, um aluno e duas alunas, de períodos e turmas diferentes, individualmente e sem combinar, sempre ficam conversando comigo no fim da aula, muitas vezes com outros alunos em volta. E sempre, sempre, sem falarem nada, pegam minha pasta ou mochila ou bolsa e carregam pra mim, até a saída do prédio e até o carro. Não me perguntam se preciso, não se oferecem, não fazem qualquer comentário sobre o problema do meu ombro. Só se antecipam e me protegem. Podiam ir embora antes, não têm qualquer obrigação de fazer isso, mas ficam até o final. Agradeço. Mas sem muito estardalhaço.

Cena 3 - dezembro de 2014: banca de defesa de TCC em cinema. Não conheço muito a formanda, só de vista e de alguns encontros fortuitos, nunca foi minha aluna. Calor forte, ar condicionado ligado e também o ventilador. A aluna está apresentando seu tema, na sala estamos eu, o orientador e outro membro da banca. Enquanto ela fala, eu, que estou sentada embaixo do ventilador, por um momento sinto mais frio e discretamente me encolho, nada muito grave, portanto, faço um gesto contido. Não falo nada para não atrapalhar a apresentação. A aluna, então, sem interromper o que está falando, se levanta e desliga o ventilador. Não fala nada, não pergunta se estou com frio. Percebe o pequeno gesto e se antecipa. O ventilador estava longe dela, não a incomodava em nada, mas procurou o meu bem-estar. Não agradeço para não atrapalhar.

Cena 4 - fevereiro de 2015: churrasco vegetariano na casa de amigas. Noite divertida, todas rindo e conversando. Uma das anfitriãs, que conheci naquele dia, está sentada na mesa redonda do lado oposto ao meu. Muitas estão fumando. Eu, inclusive. O cinzeiro está do lado dela, longe de mim. Alguém está contando uma história divertida, não quero atrapalhar, me esforço um pouco pra bater a cinza, nada muito grave, dá pra fazer isso, só preciso me esticar um pouco, mas não falo nada. A anfitriã, assim como eu e as demais, está atenta ao que está sendo falado, mas discretamente, sem falar nada e sem me perguntar se gostaria ou preciso, chega o cinzeiro um pouco mais pro centro da mesa. A cena se repete mais uma vez, melhorou bem mas ainda está um pouco longe, não preciso me esticar tanto mas preciso me afastar do encosto da cadeira, mas o gesto é bem mais discreto. Mais uma vez, sem falar nada, ainda olhando para quem fala, a anfitriã move mais uma vez o cinzeiro, o coloca no centro, pra que todos possam usá-lo igualmente, eu e ela inclusive, embora para ela, que estava fumando também, seria muito mais cômodo manter o cinzeiro perto de si. Agradeço ao final.

Quatro casos. O que unifica essas pessoas e essas histórias? Em primeiro lugar, as gentilezas pequenas, mas que causaram um bem enorme; em segundo, a presteza no préstimo, sem necessidade de perguntar se era preciso ou esperar agradecimento; em terceiro lugar, o olhar para o outro, a percepção da demanda do outro, a preocupação em ajudar o outro, a atenção para com o gesto do outro; em quarto, o silêncio do ato, que se exprime só no gesto e não requer nem justificativas nem valorizações; e por fim, o fato dos autores das façanhas acima descritas não terem a mínima ideia que me marcaram tanto, que vira e mexe lembro desses pequenos flashes de afeto e o quanto me senti agradecida pelas suas ações. To agradecendo agora e pedindo: não percam esse olhar generoso e amoroso para o mundo. Ele cria atos simples de humanidade, como os que descrevi acima, que comovem como o diabo, como já dizia o poeta.


PS: se os heróis dessas proezas plenas de gentileza me autorizarem, coloco seus nomes neste texto. ;) Eles autorizaram, então lá vai: obrigada, Marina Dutra; Luiza Gomes; Raphael Azevedo; Tassiana Benamor; Juliana Bravo e Susana Amaral!